Fabiana Piesigilli*
O fascínio com a Inteligência Artificial (IA) Generativa é compreensível: como mágica, ela pode gerar imagens, textos, conversar como um humano e trazer insights em segundos. Mas em se tratando de tomada de decisão, entre a promessa e a realidade corporativa existe um abismo. Sem uma fundação de dados sólida, a “mágica” pode se transformar rapidamente em frustração. A diferença entre hype e impacto está na fundação de dados: se a IA não tiver acesso a dados suficientes e de qualidade, ela não conseguirá gerar conclusões úteis – e se tentar, os erros serão significativos.
A questão central não está na sofisticação dos algoritmos, mas na qualidade da fundação sobre a qual construímos nossas soluções de IA. E os números são relevadores: segundo um estudo da RHEO Data, estima-se que entre 70% e 85% dos projetos de IA não atinjam seus objetivos, sejam abandonados ou nunca cheguem a produção. De acordo com outro levantamento da RAND, mais de 80% falham devido a dados inadequados e falta de clareza no problema a ser resolvido. Uma terceira pesquisa, do MIT, aponta que cerca de 95% dos projetos de IA Generativa não produzem ganhos mensuráveis em receita ou produtividade. Estes fracassos não decorrem de falta de talento ou ferramentas inadequadas, mas fundamentalmente de bases de dados fracas, mal preparadas ou fragmentadas.
Considere exemplos estratégicos que ilustram essa realidade. No setor financeiro, modelos de risco de crédito dependem de informações confiáveis de clientes; dados incompletos ou duplicados podem levar a concessões equivocadas e perdas significativas. Já no varejo, redes que buscam prever demanda futura para otimizar estoques e logística precisam de bases históricas limpas e contextualizadas. Sem isso, a IA pode induzir ao excesso de produtos de baixa saída ou à falta de itens de alta procura. Como tomar decisões estratégicas se a base informacional é falha?
Uma fundação de dados sólida vai muito além da coleta de informações: envolve criar uma base confiável, relevante, bem-governada e com diversidade e volume de dados. Isso significa ter uma estratégia de dados alinhada ao que é importante para o negócio, arquitetura de dados bem projetada com data lakes, data warehouses, pipelines de ingestão que incluam transformação e limpeza (remoção de dados duplicados, correção de erros, normalização), integração com diversas fontes de dados, além de escalabilidade para lidar com volumes massivos.
A governança de dados é essencial nesse contexto: ela define papéis, responsabilidades, políticas de acesso, padronização de conceitos e regras de uso, garantindo que todos os stakeholders possam confiar nos dados e que decisões estratégicas possam ser tomadas com segurança e consistência. A temporalidade também importa: data warehouses raramente operam em tempo real, pois isso é custoso. Em determinados contextos, informações de ontem podem já estar desatualizadas para decisões importantes de hoje. Além disso, uma base de qualidade exige completude, consistência e organização, enquanto segurança, privacidade (LGPD) e compliance ganham relevância especial quando a IA lida com dados sensíveis e pessoais.
Metadados e contextualização são frequentemente negligenciados, porém essenciais. Saber quem produziu cada dado, quando, e que transformações foram aplicadas, permite que modelos de previsão separem ruído de sinal. Marcar dados com contexto – sazonalidade, feriados, eventos especiais – diferencia previsões úteis de conclusões frágeis. A manutenção e o monitoramento contínuos reconhecem que dados não são estáticos, à medida que negócios evoluem, processos mudam e modelos podem se tornar obsoletos. Sem esses elementos, previsões estratégicas tornam-se arriscadas.
Há ainda o desafio de construir uma IA responsável, com transparência, auditoria de modelos, mitigação de vieses e supervisão humana (curadoria). Exemplos concretos ajudam a ilustrar como o viés pode emergir nas decisões estratégicas. Um caso conhecido internacionalmente é o do Apple Card, que mostrou que mulheres receberam limites de crédito muito inferiores aos seus parceiros, mesmo declarando rendas similares – evidenciando como variáveis correlacionadas ou históricos refletindo desigualdades podem gerar resultados assimétricos. Reguladores em vários países já exigem explicações detalhadas em decisões automatizadas de crédito, para garantir que não se perpetuem desigualdades disfarçadas de lógica algorítmica. A curadoria é ainda mais crítica em aplicações com atendimento direto ao cliente.
Importante destacar que a tecnologia sozinha não resolve – existe uma dimensão humana fundamental. A IA muda a forma como pessoas trabalham e exige adaptação cultural e capacitação: compreender processos, interpretar dados e incorporar os modelos às decisões estratégicas. Resistir a esse movimento abre espaço para concorrentes mais ágeis e preparados.
A mensagem final é clara: usar IA não é apertar um botão. Não adianta começar projetos de IA para decisões estratégicas sem preparar uma fundação sólida de dados, porque previsões ruins levam a decisões ruins. Investir no trabalho de preparação dos dados é o que separa as empresas que passam do hype (que é passageiro) daquelas que geram impacto real, mensurável e sustentável.
A fundação de dados não é detalhe técnico: é o alicerce que garante que a IA traga, de fato, valor para os negócios.
*Fabiana Piesigilli é Chief Operating Officer (COO) da GFT Technologies no Brasil
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