A Resolução CVM 175 é um marco regulatório para a indústria de fundos de investimento e traz avanços importantes para cotistas e prestadores de serviços. A avaliação foi compartilhada por Carlos André, presidente da ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), e João Pedro do Nascimento, presidente da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), durante o evento Fala, CVM: a nova regulação de fundos, realizado ontem (12).
Para Nascimento, a nova norma abre espaço para que a indústria de fundos brasileira, que já é muito relevante inclusive em termos internacionais, avance ainda mais. “Temos 28 mil fundos, com 25 milhões de cotistas. Pelos números oficiais da Iosco (International Organization of Securities Commissions), o Brasil, sob a ótica dos fundos de investimento, é a quarta maior indústria do mundo”, disse. E a expectativa, segundo ele, é que os números sejam ainda mais positivos ao longo dos próximos anos.
A Resolução CVM 175, publicada em 23 de dezembro de 2022, é fruto de um longo trabalho colaborativo, que durou mais de dois anos e movimentou todo o setor. André lembrou que a audiência pública da nova regra bateu recorde de colaboração do mercado, o que demonstra o engajamento de todos na busca por uma regulação capaz de impulsionar ainda mais a indústria de fundos brasileira.
Para o regulador, toda a discussão também foi muito valiosa. “Nós lemos cada uma das contribuições. Foi uma grande oportunidade de aprender com vocês e pedimos para que os regulados sempre contribuam nas audiências públicas”, afirma Nascimento.
Como resultado desse trabalho cuidadoso, os dois palestrantes mencionaram a qualidade da nova regulação e os benefícios que ela deve trazer para o mercado. “[A Resolução CVM 175] vai alçar a nossa indústria ao patamar dos mercados mais desenvolvidos do mundo, reduzindo custos, propiciando mais segurança aos investidores e trazendo ganhos de eficiência para os participantes”, disse André.
Além de André e Nascimento, também participaram do evento Pedro Rudge, vice-presidente da ANBIMA; Alexandre Rangel, diretor da CVM; Daniel Maeda, superintendente de Supervisão de Investidores Institucionais da CVM; Nathalie Vidual, gerente de Supervisão de Securitização da CVM; e Claudio Maes, gerente de Desenvolvimento de Normas da CVM.
Inovações e benefícios
Entre as inovações que a nova regra trouxe, André destacou duas: a nova estrutura que a regulação prevê para os fundos, que poderão ser divididos em classes e subclasses, e a reorganização das responsabilidades dos prestadores de serviço.
A primeira, de acordo com o executivo, vai simplificar a estrutura operacional dos fundos, abrindo espaço para soluções inovadoras e trazendo mais eficiência para os players, com ganhos de escala e maior inserção da indústria de investimentos brasileira no mercado global. Já em relação aos prestadores de serviços, André reforçou a importância de delimitar melhor os papéis e responsabilidades entre gestores e administradores.
Para Nascimento, um dos grandes ganhos que a nova regulação trouxe é a simplificação, uma vez que a Resolução CVM 175 consolidou 38 normas em uma única regra, complementada por anexos para cada tipo de fundo. Neste primeiro momento, foram publicados dois anexos — dos FIFs (Fundos de Investimento Financeiro) e dos FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios) —, mas a expectativa é que, até abril de 2023, a nova regra já esteja com todos os 12 anexos normativos previstos.
A nova regulação também promove, segundo Nascimento, mais segurança para os cotistas, que passam a ter sua responsabilidade limitada ao valor investido; simplificação operacional, com a segregação dos patrimônios por classes; e democratização do mercado, com a autorização para que investidores de varejo invistam em FIDCs e a possibilidade de os fundos investirem até 100% do seu patrimônio no exterior.
Transparência e conflito de interesses
A regulação também buscou trazer mais transparência para os cotistas. Pela nova regra, é preciso esclarecer qual é a remuneração de cada prestador de serviço, e não informar apenas uma única taxa de administração. Além disso, qualquer “rebate” (comissão) do fundo tem que ser revertido para o próprio fundo, não podendo virar remuneração para os prestadores de serviços.
Segundo Claudio Maes, o objetivo foi “dar mais clareza para o investidor em relação ao que está sendo remunerado pelo capital dele e, em certa medida, também aumentar a competitividade”. Maeda complementa que a medida segue uma pauta que é cara à CVM: o “empoderamento do varejo”, dando ao investidor mais informações para que ele possa tomar suas decisões.
Foi em nome da transparência, também, que a CVM ainda não liberou totalmente os fundos de investimento para investir no exterior. “Hoje, quando a gente roda no nosso robozinho de liquidez, aquela posição [do fundo] no exterior é um buraco negro. A gente não sabe se aquilo é líquido, se não é líquido”, explica Maeda.
Finalizando o evento, Alexandre Rangel, Natalie Vidual e Pedro Rudge se juntaram a Rangel e Maes para tirar dúvidas da audiência. Entre as questões, destacaram-se aquelas relacionadas ao operacional da nova estrutura dos fundos, com classes e subclasses. Nesse quesito, a nova norma prevê que os encargos sejam pagos diretamente pela classe, sem precisar transitar pelo fundo. “As taxas de administração e de gestão não constituem encargos do fundo e, por isso, há previsão de que o pagamento deve ser feito pelo fundo”, explica Rangel.
Já Nathalie Vidual explicou os motivos pelos quais a norma manteve a independência entre custodiante e gestor quando se trata de FIDCs. “A preocupação da CVM é conseguir separar as atividades de seleção e aquisição dos direitos creditórios da atividade de controle dos direitos creditórios. Esse conflito existe quando o mesmo prestador de serviço domina as duas pontas das atividades. Isso não é uma novidade, inclusive. A entidade já buscava preservar essa independência anteriormente. Ou seja, o custodiante também poderia delegar essa atividade desde que não fosse para o gestor”, explica.