Principal lançamento do Banco Central previsto para 2024, o Pix automático, que possibilita pagamentos recorrentes, corre o risco de ficar para o ano que vem. Oficialmente, o cronograma indica que a nova função estará disponível no dia 28 de outubro, mas até agora nenhuma das etapas de desenvolvimento previstas para os quatro primeiros meses do ano foi cumprida.
Com o fim da operação-padrão de servidores do BC, integrantes da alta cúpula da autoridade monetária entendem que o ritmo de trabalho deve aumentar e permitir que o lançamento ocorra na data prevista, mas reconhecem que há riscos diante do apertado orçamento do órgão e da equipe reduzida. Se o atraso for confirmado, a novidade pode ser lançada após o fim do mandato do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, que tem o Pix, lançado em 2020, como um dos principais legados de sua gestão.
Nos bastidores, no entanto, a sensação é de que é improvável o lançamento do Pix automático ainda este ano mesmo se a equipe e o orçamento forem reforçados. Seria preciso reduzir o tempo de desenvolvimento dos bancos e das empresas que pretendem aderir ao Pix automático.
Além disso, o entendimento é de que não adianta lançar o novo produto se não for possível realmente usá-lo desde o primeiro dia. Por isso, é importante que já haja um conjunto mínimo de prestadores de serviços prontos para receber pagamentos recorrentes por meio do Pix. Para completar janela de atraso seria de, no máximo, um mês, já que normalmente os bancos dedicam dezembro ao fechamento do balanço anual.
O que prevê o Pix automático
O Pix automático deve facilitar o pagamento de produtos e serviços que são consumidos com periodicidade definida, como contas de luz, mensalidade de academia e escola, serviços de streaming e portais de notícia, e reduzir o custo de cobrança para as empresas.
Hoje, a alternativa existente é o débito automático, que depende de convênio bilateral entre os bancos e as empresas, algo custoso, o que limita o acesso da população. A opção usada pela maioria dos prestadores de serviços é o cartão de crédito, mas a expectativa é de que o Pix automático seja mais simples e um aliado contra a inadimplência, porque não deve demandar alteração de dados na hipótese de vencimento, perda ou clonagem do cartão.
Cronograma
O cronograma do Pix automático previa a publicação de manuais e das regras em janeiro deste ano, necessários para que os bancos e demais instituições financeiras façam os ajustes para conseguir ofertar o serviço em outubro. Em março e abril, seriam entregues as especificações das plataformas que permitirão a comunicação entre os bancos e as empresas que vão receber os pagamentos via Pix automático. Já os testes finais estavam marcados para agosto e setembro.
A publicação dos manuais e das instruções normativas para a nova função depende do trabalho da área dedicada ao Pix, que tem um quadro de funcionários pequeno. Inclusive, há na diretoria colegiada uma discussão sobre realocação de servidores dentro do BC para aumentar a equipe, que esbarra, contudo, na rigidez administrativa do órgão, dizem fontes. Falta também orçamento para compra de softwares e outros equipamentos para colocar a novidade de pé, mas, nesse caso, há mais otimismo dentro do banco.
Questionado, o BC disse apenas que comunicará ao mercado sobre a evolução dos trabalhos do Pix automático na próxima reunião do Fórum Pix, que ainda não tem data para acontecer. Inicialmente, seria dia 14 de março. “O BC está trabalhando para reagendar a reunião do Fórum Pix que precisou ser cancelada por questões operacionais e, na oportunidade, comunicará amplamente o mercado sobre a evolução dos trabalhos relacionados ao Pix Automático”, disse o órgão em nota.
Alerta de Campos Neto
Ao defender a proposta de autonomia financeira e administrativa do BC, Campos Neto já tem alertado que o Pix corre riscos diante do orçamento apertado da instituição. Técnicos do órgão com conhecimento no assunto afirmam que os riscos aumentam com o crescimento constante do meio de pagamento, que está batendo 5 bilhões de transações mensais. O funcionamento regular e a segurança do sistema, contudo, é prioridade, o que acaba atrasando a agenda evolutiva.
O longo atraso deve-se em grande parte à operação-padrão dos servidores do Banco Central, que terminou na semana passada com a assinatura do acordo com o Ministério da Gestão sobre os reajustes da categoria em 2025 e 2026. Mas o sentimento de parte dos servidores do BC ainda é de insatisfação, já que a proposta do governo deixou de fora várias demandas dos técnicos do órgão.
— O governo federal foi avisado de que o não atendimento integral dos pleitos teria consequências sérias para a motivação dos servidores, com graves impactos nos trabalhos prestados pelo BC — disse o presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do BC, Fábio Faiad.
Segundo o diretor de Fiscalização do BC, Ailton Aquino, já há um pedido de recomposição do orçamento da autarquia de cerca de R$ 40 milhões. Em conversa com jornalistas nesta semana, ele disse que o BC também solicitou mais 500 vagas, além das 100 já contempladas no Concurso Nacional Unificado, para recompor o quadro de funcionários. No fim de 2023, o BC tinha 3.200 servidores ativos, contra 4.000 em 2013, ano do último concurso.
Ganha-Ganha
Para o BC, o Pix automático facilitará a vida dos consumidores e das empresas e aumentará a competição no sistema financeiro. O pagador só precisará conceder autorização para que o pagamento seja descontado de sua conta via Pix com periodicidade definida, evitando, por exemplo, que a conta do streaming ou a assinatura do jornal seja suspensa por esquecimento de pagamento ou pela troca do cartão de crédito.
Para as empresas, o Pix automático pode reduzir a inadimplência, além de viabilizar uma ampliação da base de clientes dada a disseminação do Pix. Além disso, segundo o BC, o pagamento via Pix automático tende a ser mais barato para os prestadores de serviços do que o débito automático.
Hoje, para oferecer essa possibilidade de pagamento, os prestadores de serviços precisam firmar um contrato individual com cada banco, para ter acesso à sua base de clientes. E cada banco tem um processo diferente. Na prática, os convênios são firmados apenas com os grandes bancos, que concentram o maior número de clientes, e só por um número reduzido de empresas.
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