O sonho de muitos brasileiros é se tornar patrão, assumindo as rédeas da própria vida profissional. Mas nem sempre uma boa ideia se torna um bom negócio. A seguir, dois professores da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) dão dicas para quem está pensando em empreender.
DICAS PARA EMPREENDEDORES
Segundo a professora de empreendedorismo da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), Miriam Vale, o mais importante na hora de pensar em abrir e estruturar um negócio é entender a fundo quais são as necessidades do público que queremos impactar.
“Não adianta nada ter uma ideia super engenhosa se na verdade não teremos para quem vender nosso produto ou serviço. O empreendedor nunca pode deixar de ter em mente as necessidades e os problemas do cliente que ele quer resolver. A bola da vez é a questão da empatia. Estamos nos ‘sapatos do cliente’? Não adianta ter um produto ou serviço que nos parece extremamente tecnológico e rebuscado, sendo que ninguém se dispõe a comprá-lo. Ou melhor, se o problema ou necessidade de que propomos solucionar nem existe”, alerta a docente.
Teste o negócio para saber se vai dar certo!
Segundo Miriam, antigamente, quando se falava de empreendedorismo, sempre se tinha a ideia de que era extremamente importante um plano de negócio. É claro que planejar as coisas é importante, entretanto, hoje é mais comum usar a metodologia de design thinking, que privilegia inicialmente as questões das pessoas que irão usar os produtos e serviços: o empreendedor é obrigado a se colocar no lugar do consumidor e cliente.
“A partir disso é que se deve começar a pensar em soluções que poderiam caber para os problemas e necessidades do público-alvo. A partir de todas as ideias geradas, escolhemos uma e executamos. Mesmo que não seja o ideal, é muito importante essa execução inicial para ter devolutivas o quanto antes do público e saber o que se pode melhorar”.
A partir disso, é possível surgir a ideia de testar o que os especialistas chamam de MVP (minimum viable product), ou produto mínimo viável. Um exemplo muito conhecido no mercado é o projeto realizado pela IDEO, cujo CEO, Tim Brown, tem um livro falando sobre design thinking. A equipe da IDEO fez um protótipo (MVP) de carrinho de supermercado para a Whole Foods, uma grande rede de supermercados americana que foi comprada recentemente pela Amazon. Há um vídeo na Internet sobre esse projeto e, obviamente, ao mostrar para o Whole Foods, o protótipo de carrinho não era o melhor produto que a IDEO poderia fazer, mas antes de continuar por aquele caminho, eles gostariam de saber o que o cliente achava.
“Não é exatamente o melhor produto do mundo que se pode oferecer, mas é importante que o cliente teste e diga o que achou, para que o empreendedor possa melhorá-lo ainda mais”.
Outra opção para testar as ideias é pensar em protótipos de alta ou baixa fidelidade: quando a indústria automobilística já coloca nas ruas seus carros “mascarados” para rodar, temos um protótipo de alta fidelidade, quase pronto para o lançamento no mercado.
“Podemos pensar em protótipos de mais baixa fidelidade, como um storyboard, muito usado pela indústria de filmes, que antes de rodar, por exemplo, um comercial, mostra para o cliente através de desenhos importantes os ‘takes’ e a ideia da propaganda, antes de rodá-la. Obviamente isso acontece para que não haja desperdício de tempo, pessoas alocadas em funções e mesmo de dinheiro. Assim, o mais importante do teste é recolher do seu cliente as impressões dele sobre seu produto ou serviço para que você possa melhorá-lo”.
Investir em uma ideia própria, ou abrir uma franquia?
A franquia é um modelo de negócio que já foi testado e aprovado pelo seu público. Teoricamente, o empreendedor corre menos riscos abrindo uma franquia, porque o franqueador já fez os testes necessários para abrir o negócio e teve uma curva de aprendizagem com essas tentativas e erros junto ao mercado.
Porém, o empreendedor fica um pouco limitado quando abre uma franquia. Normalmente, há uma série de regras para seguir e ele deve apresentar relatórios para o franqueador. Sem contar no pagamento de royalties e outros valores devidos, dependendo do contrato assinado entre as partes.
“Se a pessoa que deseja empreender é um pouco mais criativa e busca mais liberdade com seu negócio, talvez pensar em uma franquia que já vem basicamente toda formatada não seja tão interessante quanto colocar suas ideias para funcionar. Mas tenha sempre em mente o público-alvo que você quer atingir com seu negócio”, recomenda a especialista.
Para quem está considerando essa opção, uma sugestão é pesquisar junto à ABF (Associação Brasileira de Franchising) para saber mais informações sobre o setor que se pretende investir.
Atenção às finanças: as suas e as do seu negócio
Uma dúvida muito comum dos empreendedores é quanto recurso é preciso ter antes da abertura do negócio. Segundo Miriam, depende muito do tipo de negócio que você quer ter: dependendo do setor econômico há inclusive regulação do governo para mínimo de capital, como no caso de bancos. Além disso, quanto mais especializado um negócio e personalizado para seu cliente, mais investimento será necessário para contratar pessoas qualificadas para isso.
“Fala-se muito de se ter pelo menos seis meses das despesas fixas mensais da empresa. Mas é muito importante ter em mente antes de abrir um negócio primeiramente que suas contas pessoais devem ser absolutamente apartadas das contas de sua empresa. Vejo que principalmente empresários muito pequenos e que começaram seus negócios por necessidade e não porque viram uma oportunidade no mercado, normalmente têm esse tipo de impulso: misturar sua vida pessoal com a profissional. É difícil, mas necessário apartar sua vida financeira pessoal da de seu negócio”.
A professora acrescenta que é essencial entender as finanças da empresa e seu negócio primeiramente. Fora isso, entender o ambiente operacional da empresa: entenda que esse ambiente diz respeito ao entorno mais próximo da empresa e o empresário deve mapear e analisar concorrentes, possíveis produtos ou serviços substitutos, clientes, fornecedores, e a facilidade de entrar no setor que está atuando.
“Além disso, entender sobre a economia, questões demográficas, políticas e coisas mais gerais auxiliam muito o empresário a saber onde ele está e os possíveis problemas que enfrentará. É claro que ter experiência no mercado auxilia muito. O desafio aqui é conseguir colher dados, transformá-los em informação importante que possa ser usada a favor do negócio”.
Há muitos cursos, inclusive, gratuitos, oferecidos pelo Sebrae que podem ajudar os empreendedores com essas questões, principalmente se não forem formados em áreas de negócios.
Além disso, é preciso calma quando o assunto é retorno financeiro, pois isso também depende de uma série de fatores, como setor econômico que a empresa está atuando, público-alvo, entre outros.
TIPOS DE EMPREENDEDORISMO
Para o membro o professor e coordenador do Centro de Empreendedorismo da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) Edson Barbero, o verdadeiro empreendedor é aquele que é capaz de identificar problemas e as oportunidades, além de conseguir investir em recursos que alavanquem mudanças e proporcionem impactos positivos.
O Empreendedorismo se diferencia dos demais campos da administração de empresas e das organizações. Mais do que empreender, o empreendedor é aquele que é capaz de desenvolver atitudes amplas e se transforma protagonistas do seu próprio negócio.
“Empreender também envolve todas as demais áreas de negócios. A particularidade do empreendedorismo é que se trata de um processo de identificação, avaliação e exploração dê oportunidades no sentido de resolver problemas em mercados e sociedade”, opina.
O professor vai mais além e diz que o empreendedor bem-sucedido é aquele que consegue compreender a existência de um exemplo de necessidade de mercado transformado em uma oportunidade.
“O empreendedor desenvolve negócios, empresas no sentido de crescimento e depois leva essas soluções para o mercado e a sociedade”, justifica.
No ponto de vista mais amplo, o professor ainda garante que o empreendedorismo não está associado apenas à abertura de um pequeno negócio. Mas também pode se dar em outros âmbitos como no âmbito social.
Empreendedorismo social
Empreendedorismo social refere-se aos atos criativos de entendimento de oportunidades, de organizações e de pessoas, que visam dar um impacto social específico e intencional. “São organizações que oferecem soluções notadamente escaláveis para problemas sociais. Em especial para a população de baixa renda”, argumenta.
Nesse sentido, o empreendedorismo social refere-se às organizações que têm foco em espaços da sociedade não normalmente explorados por startup clássicas ou grandes corporações. Como por exemplo a baixa renda. Resumindo, são negócios desenhados para necessidades e características de populações menorizadas ou excluídas.
A segunda característica importante é a intencionalidade, ou seja, são as organizações que possuem uma missão explícita de gerar impacto. Para se caracterizar como empreendedorismo, sobretudo, pensa-se na ideia de inovação e escala. Portanto, que a solução entregue à sociedade possa ter alcance, atingindo o maior número de pessoas possíveis, com diferentes contextos.
Empreendedorismo sustentável
Empreendedorismo sustentável pode ter dois sentidos. O primeiro deles refere-se a uma adjetivação a quase todas as empresas, que está ou não em operação. Isto é uma necessidade de pensar como os agentes econômicos impactam seu ambiente externo, ambiente natural e social. Portanto, em certo sentido, o empreendedorismo sustentável seriam todos os projetos de natureza original ao seu redor.
Uma segunda concepção de empreendedorismo sustentável refere-se a startups e outras empresas que desenvolvem produtos especificamente voltados para melhorar as condições ambientais, sociais etc.
“Para se tornar um empreendedor sustentável é necessário adotar algumas mudanças de hábito, como por exemplo, evitar desperdícios e investir em um consumo consciente”, comenta o professor.
Empreendedorismo digital
Empreendedorismo digital é uma maneira de desenvolver negócios, expandir oportunidades que se utilizam essencialmente de meios digitais, como a internet, plataforma de comercialização, inteligência artificial, entre outros, como fundamento dos negócios.
“Hoje em dia, todos os negócios possuem características digitais. Desde o varejo, passando para o agronegócio. Vamos chamar, portanto, de empreendedorismo digital para a prática de pessoas e organizações que se baseiam essencialmente nas lógicas associadas à nova economia. Como exemplo destacamos os ‘youtuber’, aplicativos, sistemas de apoio à decisão, criptomoedas, entre outros. Isto é, a essência do negócio não mora na economia clássica, física, mas sim no universo virtual”.
Intraempreendedorismo
Intraempreendedorismo se refere ao ato de empreender dentro de uma organização, ou seja, os colaboradores utilizam suas habilidades empreendedoras dentro da empresa onde trabalham.
Um funcionário intraempreendedor é aquele que não se limita a fazer somente o que lhe é delegado, mas busca dar ideias, resolver problemas e enxergar possibilidades de melhorias e de inovações dentro da empresa.
Uma organização que abre espaço para o intraempreendedoríssimo se vê beneficiada de diversas maneiras. Ao mesmo tempo que os funcionários começam a se tornar mais motivados e engajados, a produtividade e desenvolvimento da empresa aumentam.
Os especialistas
Miriam Vale é doutora em Administração de Empresas, na linha de Estudos Organizacionais da Fundação Getúlio Vargas, tendo ficado 6 meses em Harvard para terminar de escrever sua tese. É professora de empreendedorismo da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) e coordenadora do PEIEX – Programa de Qualificação para Exportação, da APEX-Brasil, com sede na FECAP.
Edson Barbero é doutro e mestre em administração. É professor de Estratégia e Empreendedorismo e membro do Conselho Curador da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP). É especialista e estudioso em áreas como Estratégia Competitiva, Inteligência de Negócios e Marketing Estratégico.
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