No início do primeiro trimestre de 2020, a Confederação Nacional do Comércio de Bens Serviços e Turismo (CNC) tinha a expectativa de crescimento em volta de 5,3% das vendas no varejo ampliado para 2020. A inflação baixa e a taxa de juros a níveis baixíssimos davam uma expectativa de crescimento no curto-médio prazo na economia.
Na sondagem da FIEP, o otimismo também estava presente para o setor industrial. Entretanto, devido à pandemia da COVID-19, as expectativas para 2020 tomaram outros rumos, podendo se prolongar também em 2021.
O atual cenário da economia
As expectativas atuais são de queda generalizada, onde alguns setores dos varejos já experimentam este recuo. A CNC revela que em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Brasília, alguns segmentos do varejo estimam uma perda de aproximadamente 30% em seus faturamentos.
Além deste recuo nas empresas, o percentual de famílias endividadas também aumentou. Segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), o nível de endividamento em março de 2020 ultrapassou o nível do ano passado e o mesmo ocorre em abril. Em análise do gráfico abaixo, a injeção de liquidez por conta da pandemia tem aumentado a proporção de famílias endividadas:
A indústria também reverteu suas expectativas, caindo em níveis mais baixos desde 2016. O setor de indústria extrativa — o início da cadeia de produção — é o que mais apresenta uma baixa expectativa. De acordo com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), aproximadamente 92% das indústrias estão sendo impactadas negativamente. Destes 92%, 67% estão sendo muito ou mediamente afetadas.
Injeção de liquidez
O atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, garante, “com tranquilidade”, uma injeção de R$ 1,2 trilhão. Este valor equivale a 16,7% do Produto Interno Bruto (PIB). Em termos de comparação, em 2008 a injeção de liquidez chegou em termos de 3,5%. As medidas poderão ocorrer através de 1) empréstimos com lastro em letras financeiras garantidas por operações de créditos; 2) liberação de depósitos compulsórios e 3) incentivo a fluxo de caixas para pequenas e médias empresas.
A combinação perfeita para uma perigosa pressão inflacionária
O fenômeno da inflação ocorre quando a moeda perde poder de compra em comparação aos bens e serviços. Na medida em que há um aumento quantitativo do dinheiro numa economia, sem ser acompanhada por um aumento de produção, podemos admitir que, ceteris paribus, haverá inflação.
Sendo o poder de compra uma relação entre moeda e produto, devemos reconhecer que uma queda na produção poderá acarretar num aumento generalizado dos preços. Veja, estamos em uma situação onde os dois eventos que desencadeiam uma inflação estão acontecendo simultaneamente. Nós teremos queda na produção — queda na oferta de bens de consumo e bens duráveis — e um aumento extraordinário na circulação de moeda.
Para demonstrar a veracidade desta afirmação ao leitor, desenvolvi um simples modelo econométrico que busca identificar se o aumento do índice geral de preços aumenta de acordo com o alargamento da base monetária e com a queda da produção de bens de consumo e bens de consumo duráveis. Os resultados mostram um bom ajustamento do modelo com os dados reais.
Conclusão
Não precisamos de mais injeção de liquidez na economia. Na realidade, políticas que venham a incentivar o consumo irão justamente contra a mão das expectativas do governo. Ora, estimular o consumo também poderá aumentar o nível de contágio. O que precisamos é voltar a produzir tomando os cuidados necessários para não prejudicar os indivíduos que estão no grupo de risco.
Além do mais, como diria Jean-Baptiste Say:
[…] o mero consumo não beneficia o comércio; pois a dificuldade reside em fornecer os meios, não em estimular o desejo de consumo; e vimos que somente a produção fornece esses meios. Assim, o objetivo do bom governo é estimular a produção, do mau governo, incentivar o consumo.