Para citar de forma não exata o romancista Mark Twain, apesar das notícias adversas, a criptomoeda está ‘muito bem, obrigada’, e tem um futuro promissor, particularmente na América Latina. Meu otimismo pode não bater com a maioria das manchetes na virada de 2022 e no início de 2023; mas todo esse novo movimento que está só começando representa uma ótima oportunidade para se investir.
No entanto, o momento não é exatamente perfeito nem para a criptomoeda nem para o mercado tradicional. A inflação está longe do ideal em muitos lugares, incluindo uma das principais economias do mundo, os Estados Unidos. Apesar da reclamação de muitas pessoas, o FED segue segurando os juros em alta, até que haja queda contínua e sustentada aos ideais 2%.
Entretanto, a tendência é que os juros segurem a inflação em determinado momento. É assim que a economia sempre funciona, e em breve essas taxas deverão baixar e trazer maior esperança para que os investidores voltem a fazer suas aplicações, no mercado que seja.
Enquanto isso não acontece, sabemos que há desafios dentro do mercado de cripto em si, não há como negar. Amplamente divulgados, os colapsos da Terra USD, e, mais recentemente, da FTX, sem dúvida lançaram uma sombra sobre as finanças descentralizadas (DeFi), e o Bitcoin, em particular: a moeda perdeu 75% do seu valor nos dias que sucederam as notícias da crise da FTX.
Sob uma análise mais próxima, nenhuma dessas situações podem ser atribuídas a criptomoedas ou às finanças descentralizadas no geral. Pela última, me refiro a transações e trocas de valor registradas e validadas via Blockchain como oposto a estruturas tradicionais centralizadas que, no fim das contas, são garantidas (implicitamente ou não) por governos centrais.
Com a Terra UST, os ativos que supostamente respaldavam seu valor (alinhado com o dólar norte-americano) baseados na própria Luna, a moeda nativa da empresa, em oposição aos ativos da FIAT que se apóiam com outras stablecoins como USDC e tether (USDT). A UST estava de fato totalmente dependente de outra criptomoeda (ao invés de ativos tradicionais). Então, quando uma corrida pela stablecoin começou (logo após uma retirada repentina de 2 bilhões de dólares no valor da moeda), os únicos ativos disponíveis para apoiar a moeda (Luna) eram eles mesmos. E, por isso, o consequente colapso.
No caso da FTX, a exchange e o fundo de investimento Alameda Research, eram ambos do mesmo dono, Sam Bankman-Fried, mas supostamente deveriam operar de forma separada e independente. Na realidade, a Alameda fazia retiradas de dinheiro da (supostamente separada) FTX regularmente e assim que isso se tornou público, traders correram para retirar seus fundos da exchange, impulsionando seu colapso.
O primeiro caso é – no mínimo – resultado de informações incorretas. Como pode uma stablecoin (supostamente acompanhando um ativo tradicional) ser descrita como tal, quando é apenas respaldada por ativos inerentemente instáveis?
O segundo se assemelha a um caso de fraude — puro e simples; e nós saberemos mais sobre isso ao longo do tempo. Sem dúvida, esses exemplos são lamentáveis e devem ser evitados; nunca foi tão importante quanto agora que os investidores se informem e se eduquem, não só sobre a moeda que estão negociando, mas sobre as exchanges que estão utilizando. Contudo, condenar ou anular a criptomoeda com base nesses incidentes seria prematuro e injusto. Ainda mais em meio a uma economia instável, no geral. E eu me refiro à ideia de “justiça” com toda a consideração necessária.
A criptomoeda já corresponde a um método de transferência em mercados em que o sistema bancário tradicional é exageradamente caro ou inacessível. Esse tem sido tradicionalmente o caso de mercados como o Brasil, México e Colômbia, por exemplo, onde a inclusão bancária é menor. No ano passado, 500 bilhões de dólares foram transferidos para a América Latina vindos de outros países; e boa parte desse montante representa remessas essenciais para famílias com acesso limitado a serviços bancários internacionais.
A criptomoeda também tem ajudado a mitigar os efeitos da inflação em países como a Argentina e Venezuela, que tiveram taxas anuais de inflação de 114% e 79%, respectivamente. Isso deve ajudar a colocar os caprichos do valor do Bitcoin em perspectiva: as moedas FIAT tiveram o valor cortado pela metade em ambos os países nos últimos 12 meses.
A proliferação da criptomoeda — particularmente na América Latina — tem também induzido os titulares bancários notoriamente estáticos a se modernizarem a um índice sem precedentes. No ano passado, o maior banco de investimento na América Latina, BTG Pactual, também lançou sua própria plataforma de trading chamada Mynt. Esse lançamento aparentemente aconteceu para bater de frente com a companhia rival, XP Investimentos, que também estava planejando lançar a sua própria plataforma de trading em setembro de 2022, e assim o fez.
Dois meses antes, o Nubank, o maior banco fintech da América Latina, reportou que um milhão dos seus consumidores começaram a investir em criptomoedas apenas três semanas depois do lançamento da sua plataforma de cripto, batendo a meta de crescimento que tinham para o ano todo. É impossível imaginar o avanço da inovação a uma taxa elevada sem a força da criptomoeda; e ninguém poderia refutar seu impacto positivo.
E, finalmente, é desgastante comparar a criptomoeda com o sistema bancário tradicional, que tem estado na ativa de diversas formas por mais de cinco mil anos; já o Blockchain, a tecnologia que suporta cripto (e oferece uma forma descentralizada de validação), apenas está disponível desde 2009!
Automóveis eram uma rara inovação antes do modelo T, que fez do setor uma commodity, assim como era o computador antes da IBM ‘personalizá-lo’ com o 5150. Qualquer tecnologia ou modelo de negócios requer tempo para achar o seu nicho e criar valor. Por que não dar à criptomoeda essa mesma possibilidade?’
E eu não estou simplesmente propondo que a gente suspenda a descrença no mercado baseado apenas em complacência – apesar dos colapsos altamente publicados. O Bitcoin ainda foi o ativo de melhor performance no mundo durante a década de 2011-2021, entregando retornos anuais de 230%!
Para concluir, voltarei por onde começamos, com Mark Twain, mas dessa vez em uma citação direta: “o segredo para o avanço é começar”. E com esse nível de retornos do mercado, o ano de 2023 pode ser um ótimo momento para começar.
Texto escrito por Andre Silvestrini, Gerente de Senior Business Development Manager na Phemex.