Medida de Pequim sobre terras raras pode suscitar nova crise de semicondutores, atingindo montadoras em todo o mundo; investimentos poderiam favorecer o Brasil numa reconfiguração do mercado para ‘friendly shoring’, pontua Mirow & Co.
O recuo de Trump nas tarifas automotivas gera um fôlego para a cadeia global se ajustar, mas a reação de Pequim com a restrição da exportação das chamadas terras raras, que são de importância estratégica para o setor, podem suscitar uma nova crise de semicondutores e exigir mais ajustes da indústria, avalia a consultoria Mirow & Co.
Em retaliação aos EUA, o governo chinês suspendeu a venda de minerais e ímãs críticos, que são componentes centrais para fabricantes de automóveis e aeroespaciais, semicondutores e produtos militares. Devido à representatividade chinesa nesse mercado, há risco de uma nova crise global similar à dos semicondutores em 2020.
“Componentes que contêm as chamadas ‘terras raras’ são especialmente críticos porque a China detém 93% do mercado de refinamento. Na indústria automobilística, elas são utilizadas, por exemplo, em motores elétricos, na direção elétrica, em catalisadores e em semicondutores em geral”, afirma Michael Münch, sócio-associado e especialista da Mirow & Co. para a indústria automobilística.
O consultor ressalta que a indústria automotiva é extremamente integrada globalmente. As partes de um componente podem passar por três a cinco fornecedores indiretos, pelo mundo todo, até serem montadas em um veículo. A procedência de itens eletrônicos e eletromagnéticos, especialmente, é predominante da Ásia, onde estão as economias mais afetadas pelo tarifaço americano.
Para ele, o recuo da Casa Branca é um reconhecimento de que a indústria não consegue se ajustar a um novo cenário político do dia para a noite. A insistência nas tarifas teria tido um efeito desastroso, interrompendo produção e vendas, simplesmente pela incerteza e impossibilidade de planejamento, como chegou a acontecer em algumas plantas no México. “Mesmo em médio prazo é difícil imaginar que as montadoras vão conseguir ‘repatriar’ 100% da produção para os Estados Unidos, como objetiva Trump, porque falta mão de obra especializada e acesso a componentes que necessitam terras raras”, avalia Münch.
“No curto prazo, o recuo de Trump tira um pouco da incerteza do sistema, mas o efeito a médio e longo prazos depende muito de acalmar os ânimos em Pequim. À primeira vista, parece que a China está bem preparada para sustentar uma guerra comercial prolongada, podendo retaliar tarifas americanas, provocando uma interrupção na produção global comparável à crise dos semicondutores entre 2020 e 2023”, diz Münch. “O anúncio de Trump deu um fôlego para a indústria se ajustar, mas alguns ajustes serão mais difíceis do que outros”, adverte.
Impactos no Brasil
O recuo da tarifação proporciona certa estabilidade e previsibilidade, no curto prazo, reduzindo o risco de as grandes montadoras revisarem seus planos de investimento no Brasil, ou de direcionarem carros elétricos chineses ao mercado brasileiro, aproveitando a janela de tarifas reduzidas até julho de 2026.
Se a guerra comercial entre as grandes potências de fato culminar em uma nova crise de semicondutores, porém, o Brasil poderia até se beneficiar neste mercado, uma vez que possui a terceira maior reserva de terras raras no mundo, analisa o especialista.
“Para isso acontecer, todavia, seria necessário investir em capacidade de mineração e, principalmente, de refinamento. Como o país tem matriz energética renovável, poderia até abrir espaço para uma cadeia de etapas iniciais de componentes automobilísticos, dado a crescente importância do ‘near and friendly shoring’, estratégia de mitigação de riscos em suprimentos, priorizando países ‘amigáveis’ geopoliticamente,” avalia Münch. “Mas até lá, seria ainda um longo e árduo caminho”, pontua.
Sobre a Mirow & Co.
Mirow & Co. Mirow (mirow.com.br) é uma consultoria de estratégia com mindset global que entrega conhecimento funcional e em diferentes indústrias de uma forma ágil e flexível. Seus trabalhos contemplam decisões estratégicas que vêm direcionando empresas de energia, automotivas, do agronegócio, de infraestrutura, papel e celulose, entre outros setores, para a nova economia, gerando valor a seus negócios e impactando o mercado de modo sustentável. Liderada por Andreas Mirow, Elmar Gans e Felipe Diniz, conta com consultores associados em escritórios em São Paulo e Rio de Janeiro e uma ampla rede de parceiros globais em diferentes países. O modelo de atuação da Mirow alia forte capacidade de inovação à implementação e proporciona a melhor experiência para seus clientes, em função de seu jeito único de ser e atuar.